Pós-Jornada de Soluções Autocompositivas: tarde de debates encerra evento
Para encerrar a série de atividades da Pós-Jornada de Soluções Autocompositivas, promovida pelos tribunais com sede no Rio Grande do Sul – TJRS, TRT-4 e TRF-4 –, foram realizados, na tarde desta quarta-feira , três painéis sobre o tema do superenpidamento.
O primeiro painel, intitulado “O CNJ enquanto gestor da Política Pública do Tratamento do Superenpidamento”, foi apresentado, de forma online, pelo Ministro do STJ, Marco Aurélio Gastaldi Buzzi, e pela Professora Doutora honoris causa Cláudia Lima Marques, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A coordenação de mesa foi do Desembargador do TJRS, Clóvis Moacyr Mattana Ramos.
Em sua fala, o Ministro destacou que o superenpidamento tornou-se um problema social e, como tal, deve ser tratado. "Precisamos lançar um olhar objetivo sobre o superenpidamento e procurar compreender suas origens", disse. Ele apresentou um panorama no qual destacou o alto valor médio das dívidas, que afetam principalmente a classe média e média baixa, nas quais se concentra a maior parte da população brasileira. Segundo o Ministro, 45,5% dessas dívidas são de natureza bancária e financeira. Ele ressaltou a importância da fase conciliatória e dos métodos de solução consensual de conflitos, que têm sido amplamente utilizados para auxiliar a Justiça. "É mais uma maneira que o Judiciário tem de atuar em busca da paz social. Os Cejuscs, espalhados por todo o país, são um braço do Poder Judiciário", afirmou.
A segunda painelista da tarde, professora Cláudia Lima Marques, destacou a política que orienta os objetivos do Código de Defesa do Consumidor, com ênfase no artigo 4º, que trata da Política Nacional de Relações de Consumo e sua relação com a dignidade da pessoa humana. "O superenpidamento está diretamente ligado à dignidade da pessoa humana, à saúde e segurança, à proteção dos interesses econômicos e à melhoria da qualidade de vida, além da transparência e harmonia nas relações de consumo", apontou.
Ao final da apresentação, teve início o debate com o público participante mediado pela Juíza de Direito Káren Danilevicz Bertoncello.
O segundo painel da tarde foi “Superenpidamento: Fase Consensual - Pré-Judicialização”, apresentado pelos Desembargadores do TJRS, Roberto Ludwig e Ricardo Pippi Schmidt, com a moderação da Juíza Auxiliar do NUPEMEC do TJRS, Josiane Caleffi Estivalet.
Segundo o Desembargador Ludwig o direito fundamental à liberdade de negociar é um direito constitucional sagrado e expresso. "A ordem econômica nacional é regida pelo princípio da livre iniciativa. Bancos e outras instituições financeiras oferecem crédito e possuem respaldo constitucional para fazê-lo. Mas como conciliamos a atuação dessas instituições com a imposição de participar de uma conciliação? Não podemos esquecer que a justificativa para limitar essa liberdade deve ser fundamentada na garantia de uma existência digna, o que é sustentado pelo princípio constitucional do mínimo existencial', observou o magistrado.
Para encerrar o painel, o Desembargador Schmidt contextualizou o tema do superenpidamento e o sistema de justiça. E fez uma reflexão sobre a necessidade de se compreender o objetivo da lei 14.181/2021, que foi criar mais do que um procedimento especial, mas sim um microssistema para prevenção e tratamento do fenômeno do superenpidamento com práticas distintas do procedimento comum.
O evento encerrou com o painel “Superenpidamento: Fase judicial”. O debate teve a moderação da Juíza de Direito Clarissa Costa de Lima, membro do Grupo de Trabalho para aperfeiçoar os fluxos e procedimentos administrativos de tratamento do superenpidamento pelo CNJ, e como palestrantes a Desembargadora Rosana Garbin, com atuação na 17ª Câmara Cível e o Defensor Público do Estado Felipe Kirchner, dirigente do Núcleo de Defesa do Consumidor.
Ao iniciar o debate, a Desembargadora Rosana falou sobre os casos concretos de pessoas enpidadas que batem à porta do Judiciário. Mostrou a situação de consumidores que comprometem mais da metade dos salários com créditos consignados. Apresentou ainda um áudio de uma oferta de crédito por parte de um fornecedor a uma idosa sem qualquer clareza nas informações.
Para a magistrada, é preciso garantir a efetividade da lei, dando ênfase à prevenção ao superenpidamento, ao crédito responsável e à educação financeira do consumidor.
“O Judiciário tem um papel importante de criação de uma jurisprudência que sirva de guia e não de obstáculo para os direitos do consumidor”, afirmou, pontuando a necessidade do deferimento, em alguns casos, da medida liminar, evitando que o consumidor continue sendo prejudicado.
O Defensor Felipe teceu críticas às concessões irresponsáveis de crédito e da falta de cooperação dos credores em resolver a problemática.
“Estamos em uma verdadeira epidemia do superenpidamento. Não basta que credor vá a audiência, é necessário cooperação. Todo mundo precisa entender que estamos tentando salvar famílias de ruínas”, diz.
Ele citou que existem duas categorias de superenpidados: os ativos, que se pidem entre os de má fé, que são os estelionatários, e os de boa fé, aqueles que não têm controle financeiro ou que são vítimas de propagandas enganosas, e os passivos, em que há uma questão externa levando eles a se enpidarem, como uma situação, por exemplo, de doença, desemprego.
Segundo o Defensor, com base em pesquisas, a maior parte dos superenpidados se classifica como passivo e, na maioria das situações, nem foi responsável pela situação, mas sim um familiar que pediu ajuda a ele.
“Ocorre de as pessoas contratarem empréstimos para suprir uma necessidade no contexto familiar, comprometendo a renda por algo que não é dela. Muitas vezes se enpidam por terceiros”, afirma, concluindo que o problema não é só econômico, mas também social.
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